Resenha: POULANTZAS, Nicos. “A lei” in “Crítica do
Direito”, São Paulo, Ciências Humanas, (pp. 63/82) 1980.
Aluna:
Jordania Marcia Carvalho Leal
Período:
Matutino
Parte a – “A lei” IN “CRÍTICA DO DIREITO”
O
papel da lei, para Nicos Poulantzas é apresentado como uma questão da repressão
no exercício do poder. A partir deste ponto de vista diferencia os Estados
capitalistas dos pré-capitalistas, sendo capitalista quando ocorre exatamente a
ruptura do pré-capitalista, e, por conseguinte, a força da lei.
O
binômio Lei-Terror é apreendido, pelo fato de quê à lei vem para limitar o
poder, que aparentemente é ilimitado do Estado, no caso, o Estado capitalista,
através da lei limita o livre arbítrio e até mesmo certa forma de exercício da
violência.
Na
tese do autor fica claro que a leis e as regras sempre estiveram presentes na
constituição do poder, desde o período feudal até o medieval, até mesmo antes
do Estado capitalista.
Toda
forma estatal, mesmo a mais sanguinária, edificou-se sempre como organização
jurídica. Exemplos de Stálin e sua constituição de 1937, reputada como a “mais
democrática do mundo”, portanto, para o autor algo falso, para ele o que
ocorreu é a vontade do príncipe no reino da lei, vontade cheia de abusos. Essa
questão jurídico-legalista, já estabelecida na sociedade capitalista, não
passou despercebido pelos pensadores clássicos Marx, Max Weber, Maquiavel e Hobbes.
O
Estado de direito, o Estado da lei por excelência que detém, ao contrário dos
Estados pré-capitalistas, o monopólio da violência e do Terror supremo, o
monopólio da guerra.
A
lei é parte integrante da ordem repressiva e da organização da violência
exercida por todo Estado. A lei é, neste sentido, o código da violência pública
organizada. A negligência do papel da lei na organização do poder é constante
naqueles que ignoram o papel da repressão física no funcionamento do Estado:
Foucault especialmente, como se vê em sua última obra. A vontade de saber
sequencia lógica de peregrinações em Vigiar e punir.
A
violência-consentimento, repressão-ideologia, significa que o poder moderno não
se baseia na violência física organizada, mas na manipulação ideológica-simbólica,
na organização do consentimento, na interiorização da repressão (o “tira” na
cabaça). As origens desses conceitos estão na escola de Frankfurt – as famosas
análises de substituição da família à polícia como instância autoritária – e de
Marcus e de Pierre Bourdieu sobre a chamada violência simbólica (palavras).
A
lei nunca intervém como aqui sob a forma de codificadora da violência física,
mas como figura do Senhor, que, só por sua presença, enunciação ou discurso,
induz o desejo e o amor dos sujeitos. O binômio repressão-violência
substitui-se pelo binômio lei-amor, interdito-desejo, porém o papel a violência
na base do poder é sempre subestimado: só se considera as razões do consenso.
Na
realidade qual é o papel da violência? O Estado capitalista, ao contrário dos
Estados pré-capitalistas, detém o monopólio da violência física legítima. Cabe
a Max Weber o mérito de ter esclarecido este ponto, mostrando que a
legitimidade do Estado, que concentra a força organizada, é a legitimidade “racional-legal”
fundamentada na lei: a acumulação prodigiosa de meios de coação corporal pelo
Estado capitalista acompanha seu caráter de Estado de direito. O grau de
violência física aberta exercida nas diversas situações de poder “privado”
exteriores ao Estado, da fábrica às famosas microssituações de poder, está em
repressão na exata medida em que o Estado se reserva o monopólio da força
física legítima. Tudo se passa como se o Estado precisasse usar menos a força
na medida em que detém o monopólio legítimo.
Concluir
que o poder e domínio modernos não mais se baseiam na violência física é a
ilusão atual. Mesmo que essa violência não transpareça no exercício cotidiano
do poder, como no passado, ela é mais do que nunca determinante.
A
violência física monopolizada pelo Estado sustenta permanentemente as técnicas
do poder e os mecanismos do consentimento, está escrita na trama dos
dispositivos disciplinares e ideológicos, e molda a materialidade do corpo
social sobre o qual age o domínio mesmo quando essa violência não se exerce
diretamente. A monopolização pelo Estado da violência legítima permanece o
elemento determinante do poder.
A
lei detém um papel importante (positivo e negativo) na organização da repressão
ao qual não se limita; é igualmente eficaz nos dispositivos de criação do
consentimento.
Frequentemente,
o Estado age transgredindo a lei-regra que edita, desviando-se da lei ou agindo
contra a própria lei. Chama-se a isso razão de Estado, que significa que a
legalidade é compensada por “apêndices” de ilegalidade e que a ilegalidade do
Estado está sempre inscrita na legalidade que institui.
Todo
sistema jurídico inclui a legalidade assim como comporta, como parte integrante
de seu discurso, vazios e brancos “lacunas da lei”. Todo Estado é organizado em
sua ossatura institucional de modo a funcionar (e de modo a que as classes
dominantes funcionem) segundo a lei e contra a lei.
Para
Marx, todo Estado é uma “ditadura” de classe. Essa ditadura designa organização
de todo Estado como ordem funcional única de legalidade e ilegalidade, de uma
legalidade vazada por ilegalidade.
A
LEI MODERNA – O direito capitalista é específico no que forma um sistema
axiomatizado, composto de conjunto de normas abstratas, gerais, formais e
estritamente regulamentadas.
Na
divisão social do trabalho e o processo de produção que se dá a violência, o
lugar e o papel que desempenha no capitalismo.
A
lei moderna encarna assim o espaço-tempo, o quadro referencial material do
processo de trabalho: espaço/tempo serial, cumulativo, contínuo e homogêneo.
Essa lei transforma os indivíduos em sujeitos-pessoas jurídico-políticos ao
representar a unidade como povo-nação.
Nos
Estados pré-capitalistas há a presença da Religião, do soberano divino, nas
sociedades capitalistas as leis são representações da razão, do ponto de vista
iluminista. É nas formas do direito e da ideologia jurídica que se conduz a
luta contra a Religião, e nas categorias jurídicas é que se pensam as ciências
físicas da Idade da Luz. A lei abstrata, formal, universal, é a verdade dos
sujeitos, é o saber (a serviço do capital) que constitui os sujeitos, é o saber
(a serviço do capital) que constitui os sujeitos jurídico-políticos e que
instaura a diferença entre privado e o público. A lei capitalista traduz assim
o despojamento total dos agentes da produção de seu poder intelectual em
proveito das classes dominantes e de seu Estado.
Todo
agente do Estado em amplo sentido, parlamentar, político, policial, oficial,
juiz, advogado, funcionário, assistente social, etc., é um intelectual na
medida em que é um homem da lei, que legisla que conhece a lei e o regulamento,
que os concretiza que os aplica. Ninguém é considerado ignorante da lei, máxima
fundamental de um sistema jurídico moderno onde ninguém, salvo os
representantes do Estado, pode conhecê-la. O conhecimento requisitado a todo
cidadão, se expressa na máxima dependência-subordinação frente aos funcionários
do Estado, ou seja, os fazedores, os guardiões e os aplicadores da lei, das
massas populares cuja ignorância (o segredo) da lei é uma característica desta
lei e da própria linguagem jurídica. A lei moderna é um segredo de Estado,
fundadora de um saber açambarcada pela razão de Estado.
Esta
especificidade da lei e do sistema jurídico capitalista tem, portanto, seus
fundamentos nas relações de produção e na divisão social capitalista do
trabalho: ela se relaciona assim com as classes sociais e com luta de classes
tais como elas existem sob o capitalismo.
Os
Estados pré-capitalistas apresentavam um sistema jurídico simples, já os Estado
capitalistas apresentam um sistema que exige um cálculo rígido, é isso que
permite a axiomatização do direito: seu caráter sistemático, com base em normas
abstratas, gerais, formais e estritamente regulamentarizadas, consiste entre
outras coisas em comportar suas regras de transformação, fazendo assim com que
suas modificações se tornem transformações reguladas no seio de seu sistema
(papel notadamente da Constituição).
A
lei regula o exercício do poder político pelos aparelhos de Estado e o acesso a
esses aparelhos por meio precisamente desse sistema de normas gerais, abstratas
formais.
Parte B – OPINIÃO Da ALUNa: jORDANIA MARCIA CARVALHO LEAL
Este texto é bem
expressivo, audacioso e crítico, também não poderia ser menos, uma vez que se
refere à crítica ao direito, conhecimento com certo poder elitista, político e
recheado de verdades, que embora saibam não ser absolutas, por isso se trata de
ciência, mas, com todo ar em volta de questões cognitivas protegidas e de
fortíssimo alicerce sobre as relações sociais.
Neste caso o foco é
“a lei”, a legalidade e a ilegalidade, o poder do Estado, a violência física X
a violência simbólica, os Estados pré-capitalistas, os Estados capitalistas
serviram de base para completar a tese do autor.
Nicos Poulantzas faz
uma releitura de Karl Marx, Max Weber, Maquiavel e Hobbes, para reforçar suas análises.
Em Marx, percebemos a
desenvoltura do autor sobre as questões da sociedade civil organizada, e por
isso, capitalista, luta de classes, ditadura da classe representada pelo
Estado, que atende a essa classe dominante, a presença da classe dominada - os
trabalhadores, a questão da divisão social do trabalho e o processo de
produção, onde está presente a questão da violência por parte da lei, no Estado
capitalista. Poulantzas traz à tona os conceitos de violência física e violência
simbólica (símbolos, palavras), autores que trabalharam esses conhecimentos,
foram: a escola de Frankfurt, ao retornar a antiguidade e rever a questão do
público e do privado, e principalmente o sociólogo francês Pierre Bourdieu que
trata da violência simbólica, a palavra de autoridade que neutraliza o outro,
legitimidade nos argumentos do discurso dominante, que detém e neutraliza
através do poder simbólico, a exemplos contemporâneos temos o bullyng, o
racismo e a questão de gênero. Na violência simbólica, não necessariamente
ocorre a violência física.
Sobre Max Weber,
Poulantzas retoma o assunto principal, que é a legitimidade, dentro de um dos
tipos ideais de dominação, da obra de Weber que é a racional-legal, concluindo
que a legitimidade é o consentimento da sociedade, na qual a maioria aceita a
lei, e, portanto, o poder violento do Estado sobre as ações das relações
sociais, ditando as regras do jogo, contornando e fazendo parte do controle
social.
Hobbes tem-se o
Leviatã, que é o monstro o próprio Estado sobre os indivíduos participantes
desta sociedade que cria e obedece ao todo.
Maquiavel apresenta
em suas obras a questão da força, no qual está a questão de violência, para que
seja protegido o território, e manutenção do poder, é melhor ser temido que
amado, é uma das características principais, da política, enquanto ciência
política, o tripé: virtude, oportunidade (fortuna) e a força.
Michael Foucault,
filósofo francês, é abordado em sua obra de Vigiar e Punir, na inquisição, com
advento da Religião o criminoso é punido pela roda, fogueira e forca, em público dominação pelo terror, na
sociedade capitalista, econômica a punição é diferente tem haver com o modo de
produzir, com o trabalho, com as idéias dominantes burguesas, o poder e o saber.
Quanto ao assunto
legalidade e ilegalidade, é ponto interessante, como o autor apreende a função
do Estado, ora legal, ora ilegal, as leis como códigos fortes e fracos, como
que se já previsse a atitude da ilegalidade e tivesse meios para se sair bem,
ele os coloca como leis em branco, vazios, lacunas da lei.
O absolutismo, que
foi a transição para o capitalismo, exemplo abordado, para mostrar a diferença
entre um Estado pré-capitalista e um Estado capitalista.
Entretanto,
Poulantzas não se fecha apenas na lei como negativa, mas nos faz enxergar a lei
como positiva e negativa.
A lei é uma
materialização da ideologia dominante, mas é bem claro que no pré-capitalista a
Religião, o Senhor, o Divino, estava sempre presente; no entanto, na sociedade
capitalista o autor fala sobre o cálculo, a sistematização, a lei como um
conjunto, um ordenamento bem elaborado e separado da Religião, como um direito
laico.
A lei moderna é
abstrata, universal e formal, um sistema axiomatizado, a lei está ligada a
questões econômicas, e estas estão à disposição das classes dominantes, a favor
do Capital.
Para Marx o direito
existia enquanto houvesse o Estado, sem classes sociais, o Estado não mais
existiria, teríamos o modo de produção comunista, e, consequentemente o direito
deixaria de existir também.
Neste texto dá-se a
impressão de quê a lei está para burlar a justiça, pensando justiça como
igualdade entre os cidadãos, que não há, mas que abstratamente é posto, ou nos
é imposto, como obrigação, e, portanto, há violência, há força, há poder,
revestido no belo “a lei”. O autor traz a essência da lei e distingue a
aparência da lei moderna, que é a impressão de que a lei não mais se baseia na
violência física.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
POULANTZAS, Nicos. “A lei” in “Crítica
ao Direito”, São Paulo, Ciências Humanas, (pp. 63/82) 1980.
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