RESUMO:
A POLÍTICA
.
DISCIPLINA:
FILOSOFIA GERAL E DO DIREITO
DOCENTE:
KARINE KREWER
DISCENTE: JORDANIA
MARCIA CARVALHO LEAL
CUIABÁ
2012
ARISTÓTELES,
A POLÍTICA / ARISTÓTELES: tradução Roberto Leal Ferreira – 2.ed. – São Paulo:
Martins Fontes, 1998 – (Clássicos). São Paulo – 2002.
LIVRO II
DO CIDADÃO E DA CIDADE
DO CIDADÃO
O Estado é o sujeito constante da
política e do governo; a constituição política não é senão a ordem dos
habitantes que o compõem.
O Estado é uma totalidade e consiste
numa multidão de partes: é a universalidade dos cidadãos.
O CRITÉRIO DA CIDADANIA
Falemos aqui apenas dos cidadãos de
nascimento e não dos naturalizados. Não é residência que constitui o cidadão:
os estrangeiros e os escravos não são cidadãos, mas sim habitantes.
O que constitui propriamente o
cidadão, sua qualidade verdadeiramente característica, é o direito de voto nas
Assembleias e de participação no exercício do poder público em sua pátria.
Há dois tipos de poderes: uns são
temporários, só são atribuídos por certo tempo e não se podem obter duas vezes
em seguida, os outros não têm tempo fixo, como o de julgar nos tribunais ou de
votar nas assembleias.
A definição do cidadão, portanto, é
suscetível de maior ou menor extensão, conforme o gênero do governo.
É cidadão aquele que, no país em que
reside, é admitido na jurisdição e na deliberação.
De acordo com nossa definição, a
coisa é simples. Se participarem do poder público, será cidadão.
AS DIVERSAS ESPÉCIES DE
CIDADÃOS
Há várias espécies de cidadãos, mas
os verdadeiros são apenas os que participam dos cargos. Quando Homero fala de
um fugitivo ou de um vagabundo, é pela exclusão dos cargos públicos que o
caracteriza.
“Tratado sem nenhum respeito,
excluído da Cidade.”
Quem quer que não participe dela,
com efeito, é como um estrangeiro que acaba de chegar.
Se em algum lugar escondem esta
distinção, fechando os olhos sobre os domiciliados que usurpam a qualidade de
cidadão, é para iludi-los e disfarçar sua malignidade.
AS VIRTUDES QUE FAZEM O
CIDADÃO E O HOMEM DE BEM
Exame para se saber se as mesmas
virtudes fazem o homem de bem e o bom cidadão.
A virtude do cidadão deve ser para
que todos trabalhem para conservação de sua comunidade, ou seja, para a
salvação do Estado.
Há várias espécies de governo, é
impossível que as virtudes cívicas e o civismo perfeito sejam os mesmos em toda
parte.
Para melhor discutir esta questão,
convém situarmo-nos no melhor governo possível. Veremos, por um lado, que é
impossível que o Estado seja composto inteiramente de homens perfeitos, e, por
outro, que é preciso que cada um execute o melhor possível suas funções. Uma
vez que parece impossível que todos os cidadãos se assemelhem, não pode o mesmo
gênero de virtude fazer o bom cidadão e o homem de bem. Mas todos devem ser
bons cidadãos.
O mérito de um homem de bem e o de
um bom cidadão são, portanto, coisas distintas.
O Estado, aliás, é um composto de
partes dessemelhantes, todos trabalham para a conservação de sua comunidade, ou
seja, para a salvação do Estado.
Portanto, se há várias espécies de
governo, é impossível que as virtudes cívicas e o civismo perfeito sejam os
mesmos em toda parte, ou que eles se confundam com a virtude absoluta pela qual
distinguimos as pessoas nobres. É evidente que se pode ser bom cidadão sem
possuir virtudes tão eminentes.
Porém, para melhor discutir esta
questão, convém situarmo-nos no melhor governo possível. Veremos, por um lado,
que é impossível que o Estado seja composto inteiramente de homens perfeitos,
e, por outro, que é preciso que cada um execute o melhor possível suas funções.
Uma vez que parece impossível que todos os cidadãos se assemelhem, não pode o
mesmo gênero de virtude fazer o bom cidadão e o homem de bem. Mas todos devem
ser bons cidadãos. É daí que provém a bondade intrínseca do Estado, sem que
seja necessário que haja entre toda a igualdade de mérito. O mérito de um homem
de bem e o de um bom cidadão, são, portanto, coisas distintas.
O Estado, aliás, é um composto de
partes dessemelhantes, aproximadamente como o animal se compõe da alma e do
corpo; a alma, de razão e de paixões; a família, do homem e da mulher; a casa,
do senhor e do escravo.
A desigualdade de mérito é, pois,
evidente.
No entanto, é bom saber igualmente
mandar e obedecer, e um cidadão experimentado é aquele que é capaz de ambos os
papéis.
Existe uma máxima quanto a isto, que
diz que não é possível bem comandar se antes, não se tiver obedecido.
Ora, estes são dois gêneros
diferentes de mérito, é preciso que um bom cidadão adquira ambos, saiba
obedecer e esteja em condições de comandar.
O mérito especial do que comanda é a
prudência. As outras virtudes lhe são comuns com os que obedecem. Estes não
precisam de prudência, mas sim de confiança e de docilidade; são como os
instrumentos ou então como o fabricante de alaúdes, e o homem que comanda é
como o executante que os toca.
CAPÍTULO V
DA FINALIDADE DO ESTADO
O homem é, por sua natureza, como
dissemos desde o começo ao falarmos do governo doméstico e dos escravos, um
animal feito para a sociedade civil.
A cidade é uma sociedade
estabelecida, com casas e famílias, para viver bem, isto é, para se levar uma
vida perfeita e que se baste a si mesma.
Foi para o mesmo fim que se
instituíram nas cidades as sociedades particulares, as corporações religiosas e
profanas são todos os outros laços, afinidades ou maneiras de viver uns com os
outros, obra da amizade, assim como a própria amizade é o efeito de uma escolha
recíproca.
O fim da sociedade civil é,
portanto, viver bem. Todas as suas instituições não são senão meios para isso,
e a própria cidade é apenas uma grande comunidade de famílias e de aldeias em
que a vida encontra todos estes meios de perfeição e de suficiência. É isto o
que chamamos uma vida feliz e honesta.
AS CONDIÇÕES DA FELICIDADE
PARTICULAR
Ninguém contestará a divisão,
habitual entre os filósofos, dos bens em três classes: os da alma, os do corpo
e os exteriores. Todos estes bens devem ser encontrados junto às pessoas
felizes.
Os bens exteriores são apenas
instrumentos úteis, conforme o seu fim, mas semelhantes a qualquer outro
instrumento, cujo excesso necessariamente é nocivo ou, pelo menos, inútil a
quem os manipula.
Os bens da alma, pelo contrário, não
são apenas honestos, mas também úteis, e quanto mais excederem a medida comum,
mais terão utilidade.
Dos mesmos princípios depende a
felicidade do Estado. É impossível que um Estado seja feliz se dele a
honestidade for banida.
FELICIDADE PRIVADA E
FELICIDADE PÚBLICA
Resta-nos explicar se a felicidade é
idêntica para o Estado e para cada particular.
Não entra no plano da Política
determinar o que pode convir a cada indivíduo, mas sim o que convém à
pluralidade.
Não existe Estado feliz por si mesmo
senão o que se constitui sobre as bases da honestidade. É possível encontrar
algum cuja posição não permita nem guerrear, nem pensar em vencer. Sua
felicidade não deixará de estar garantida, desde que ele use de civilidade e de
leis virtuosas. Portanto, se devemos considerar honestas os exercícios
militares, não é enquanto fim último, mas como estabelecidos para um fim
melhor.
A VIDA ATIVA, FONTE DAS DUAS
FELICIDADES
Não é exato elevar a inação acima da
vida ativa, já que a felicidade consiste em ação, e as ações dos homens justos
e moderados têm sempre fins honestos.
Entre semelhantes, a honestidade e a
justiça consistem em que cada um tenha a sua vez. Apenas isto conserva a
igualdade. A desigualdade entre iguais e as distinções entre semelhantes são
contra a natureza e, por conseguinte, contra a honestidade.
Os Estados mais isolados não podem
permanecer na ociosidade mesmo que queiram, a não ser por frações de tempo e
por intervalos. Se não têm comunicação com o exterior, há ao menos comunicação
necessária com o exterior, há ao menos comunicação necessária de uma parte a
outra. O mesmo ocorre com as cidades e com os indivíduos entre si. Nem mesmo o
próprio Deus e o mundo inteiro seriam felizes se, além de seus atos internos,
eles não se manifestassem exteriormente pelos seus benefícios.
E, portanto, claro que a fonte da
felicidade é a mesma para os Estados e para os particulares.
CAPÍTULO VI
DA EUGENIA E DA EDUCAÇÃO
Como é a própria virtude que, em
nosso sistema, faz o bom cidadão, o bom magistrado e o homem de bem, e como é
preciso começar obedecendo antes de comandar, o legislador deve cuidar
principalmente de formar pessoas honestas, procurar saber por quais exercícios
tornará honestos os cidadãos e, sobretudo conhecer bem qual é o ponto capital
da vida feliz.
Há na alma duas partes distintas,
uma possui a razão, e outra não participa dela, mas pode obedecer-lhe.
A parte que goza da razão é sem
dúvida a melhor. Segundo o sistema de Aristóteles esta parte se subdivide em
duas outras: a parte ativa e a parte contemplativa.
Ora, os atos devem corresponder a
suas faculdades e seguir a mesma divisão. Aqueles que provêm da parte mais
excelente são, por conseguinte, preferíveis, quer os comparemos em bloco, quer
o confronto se faça de um por um.
Toda a vida se divide entre o Trabalho
e o repouso, a guerra e a paz, e todas as nossas ações se dividem em ações
necessárias, ações úteis ou ações honestas. Devemos estabelecer entre elas a
mesma ordem que entre as partes de nossa alma e seus atos, subordinar a guerra
à paz, o trabalho ao repouso e o necessário ou útil ao honesto.
Um legislador deve levar tudo isso
em consideração ao escreve suas leis, respeitar a distinção das partes da alma
e de seus atos; ter especialmente em vista o que há de melhor, assim como o fim
que deseja alcançar, conservar a mesma ordem na divisão da vida e das ações;
dispor tudo de tal maneira que se possa tratar dos negócios e guerrear, mas que
se prefira sempre o repouso aos negócios, a paz à guerra, e as coisas honestas
às coisas úteis e até as necessárias. É de acordo com este plano que se deve
dirigir a educação das crianças e a disciplina de todas as idades que dela
precisam.
FIM PACÍFICO DA EDUCAÇÃO
Não é, sobretudo, nem uma felicidade
para o Estado, nem um sinal de sabedoria para o legislador treinar seu povo
para vencer seus vizinhos. Disso só podem resultar grandes males, e aquele que
for bem-sucedido não vai deixar de investir contra a sua própria pátria e, se
puder se assenhorear-se dela. Essa é a censura que os lacedemônios fazem ao rei
Pausânias, cuja ambição não se contentou
com este alto grau de honra.
Não pois, nem política, nem
utilidade, nem bom senso em semelhantes concepções nem numa tal legislação.
Um legislador deve imprimir
profundamente no espírito de seu povo que o que é muito bom para cada um em
particular o é também para o Estado; que não convém entregar-se ao treinamento
militar a fim de sujeitar os que não o merecem;
O objetivo não é dominar toda a
terra, mas apenas os que não são capazes de bem usar de sua liberdade e
merecerem a escravidão por sua maldade.
Que todo legislador deva subordinar
a guerra e todas as suas outras leis ao repouso e à paz é o que prova a
experiência, juntamente com a razão.
A paz deve ser o fim da guerra e o
repouso, o do trabalho.
A razão e o intelecto são a
principal e derradeira parte onde se manifesta para nós a obra da natureza.
A alma e o corpo são duas
substâncias distintas, assim também a alma tem duas faculdades não menos
distintas, uma iluminada pela razão e outra que não tem esta luz; há dois tipos
de hábitos, uns apaixonados ou provindos da sensibilidade, outras intelectuais.
O raciocínio e a inteligência só lhes vêm
naturalmente com a idade.
Convém, portanto, dar as primeiras
atenções ao corpo, as segundas aos instintos da alma, recorrendo-se, todavia,
ao intelecto ao tratar dos apetites e a alma, ao tratar do corpo.
A REGULAMENTAÇÃO DOS
CASAMENTOS E DOS NASCIMENTOS
Devendo
o legislador cuidar antes de tudo da boa conformação do corpo dos súditos que
deverá criar, cabe-lhe começar por bem regular os casamentos, determinando a
idade e a compleição dos que julgar admissíveis na sociedade conjugal.
Para estabelecer boas leis sobre
esta associação, é preciso em primeiro lugar atentar para a idade e para as
qualidades pessoais dos noivos, para que eles se convenham em maturidade e em
força; se, por exemplo, sendo o homem capaz de gerar, a mulher não é estéril,
ou se pelo contrário, podendo esta conceber, não é o homem que é impotente.
Esta má combinação só é boa para
criar discórdia e para contrariar. Não devem pais e filhos ter idades tão
distantes e nem tão próximas.
O final da procriação ocorre, para
os homens, aos setenta anos, para as mulheres, aos cinquenta.
Observa-se, com efeito, esta
imperfeição em todos os lugares em que as pessoas se casam jovem demais. Só
nascem abortos.
O parto das moças jovens é, aliás,
penoso demais e elas morrem em maior número.
Para preservar o sexo dos perigos da
incontinência, esperar para casá-las certo tempo após a puberdade. Aqueles que
conhecem cedo demais o uso das familiaridades conjugais são de ordinárias mais
lascivas.
A verdadeira idade para casar as
moças é aos dezoito anos e para os homens aos trinta e sete, aproximadamente.
Com isso a conjugação dos corpos se
fará em pleno vigor, e a geração, depois, terminará num tempo conveniente tanto
para um como para outro.
Quanto à estação do ano própria à
geração, o inverno é a que mais convém.
Também será bom consultar sobre esta
matéria os preceitos dos físicos e dos médicos.
Os médicos ensinam quais estações e
os físicos que ventos são favoráveis ao ato sexual; por exemplo, eles preferem
o vento do norte ao do sul.
Durante a gravidez, as mulheres
devem ficar atentas à sua conservação, tirá-las da ociosidade, prescrever-lhes
um regime alimentar substancial, dar-lhes exercícios fazendo com que visitem
todos os dias os templos dos deuses honrados para a geração. Se o corpo precisa
de movimento, o espírito necessita de repouso e de tranquilidade.
No ventre da mãe os filhos recebem,
como os frutos da terra, a impressão do bem e do mal. Sobre o destino das
crianças recém-nascidas, deve haver uma lei que decida os que serão expostos e
os que serão criados. Não seja permitido criar nenhuma que nasça mutilada, isto
é, sem algum de seus membros; determine-se, pelo menos, para evitar a
sobrecarga do número excessivo, se não for permitido pelas leis do país
abandoná-los até que número de filhos se podem ter e se faça abortarem as mães
antes que seu fruto tenha sentimento de vida, pois é nisto que se distingue a
supressão perdoável do que é atroz.
Determinamos agora a época que se
deve parar, encerrar a procriação. De fato, os filhos das pessoas de idade são,
assim como os dos jovens demais, imperfeitos, de corpo e de entendimento; os
filhos dos muito velhos mostram-se absolutamente frágeis e débeis. Neste ponto,
devem-se seguir as épocas da natureza e preferir aquela em que o espírito e a
inteligência adquiriram seu pleno vigor, o que, segundo certos poetas que
dividem a idade em semanas ou septenários, acontece de ordinário por volta dos
cinquenta anos.
Passado em quatro ou cinco anos esta
idade, deve-se renunciar à propagação da espécie e até ao comércio com as
mulheres, seja por motivo de saúde ou algo semelhante.
Quanto às relações após o casamento
com outra mulher ou outro homem que não aquela ou aquele a que se está unido,
isto deve ser considerado como uma diversão absolutamente desonesta.
Se ainda se estiver em idade de ter
filhos, o adultério deve ser marcado de infâmia e punido segundo a enormidade
do crime.
A EDUCAÇÃO DA INFÂNCIA
São muito importantes para a criança
em sua formação os alimentos de que vão nutrir-se. O leite é o alimento mais
conveniente ao corpo. O vinho não é bom para aquela idade; assim, deve-se
descartar seu uso.
Todos os movimentos possíveis são
úteis para os bebês. Desde o nascimento, é bom acostumar as crianças ao frio.
Até os cinco anos, não é conveniente
dar nada para as crianças aprenderem, nem submetê-los a qualquer trabalho. Isto
poderia impedir seu crescimento.
Basta mantê-las em movimento para
preservar seus corpos da preguiça e do peso.
Em certos lugares, comete-se o erro
de proibir à criança o choro e os movimentos expansivos. Todos estes atos
servem para seu desenvolvimento e fazem parte, por assim dizer, dos exercícios
corporais.
As crianças devem ser impedidas
muita conversa e familiaridade, sobretudo com os escravos.
A educação doméstica durará até sete
anos.
O legislador deve até mesmo banir do
Estado todas as conversas indecentes.
Se proibirmos as conversas
indecentes, com mais forte razão proibiremos as pinturas e as exibições do
mesmo gênero.
Também se deve proibir aos jovens,
os teatros e, sobretudo a comédia, até que tenham atingido a idade de
participar das refeições públicas e a boa educação os tenha colocado em
condições de experimentar impunemente a bebedeira dos banquetes, sem contrariar
a embriaguez ou os outros vícios que a acompanham.
São as primeiras impressões as que
mais nos afetam. Deve-se, portanto, afastar dos jovens as más, especialmente as
que levam ao atrevimento e à maldade.
Entre os cinco e sete anos, as
crianças serão simplesmente espectadores dos exercícios que lhes devem ser
ensinados mais tarde.
Aos sete anos, a educação divide-se
em dois grupos, um até a puberdade, outra da puberdade até os vinte e um anos.
CARÁTER PÚBLICO E OBJETO DA
EDUCAÇÃO
Em suas diversas fases, a educação
das crianças se revela um dos primeiros cuidados do legislador, Ninguém o
contesta. A negligência das Cidades sobre este ponto é-lhes infinitamente
nociva.
Não há dúvida, de que, entre as
coisas úteis, se deve começar aprendendo as necessárias, mas nem todas. Distinguem-se as profissões honestas das não
liberais. Deve-se limitar a educação aquelas cujo exercício não é aviltante, e
considerar vis toda arte e toda ciência que tornam o corpo, alma e inteligência
das pessoas livres incapazes para o exercício e para a prática da virtude. São
desse gênero todos os trabalhos mercenários e todos os ofícios que deformam o
exterior e aviltam ou fatigam o intelecto.
O PAPEL DA MÚSICA
Há mais ou menos quatro coisas que
de ordinário se ensinam às crianças,1º as letras, 2º a ginástica, 3º a música;
alguns acrescentam e 4º a pintura; a escrita e a pintura para as diversas
circunstâncias da vida; a ginástica por servir para educar a coragem.
Quanto à música, sua utilidade não é
igualmente reconhecida. Muitos hoje a aprendem apenas por prazer.
A música é o princípio de todos os
encantos da vida. A música serve pelo menos para passar agradavelmente o lazer.
É por isso que ela foi posta na moda. Ela pareceu a seus inventores a diversão
conveniente às pessoas livres.
Por isso Homero, após ter descrito
uma refeição suculenta e nomeado várias dos que concorriam para a alegria da
festa, acrescenta:
Convidemos para o banquete um cantor harmonioso.
Convidemos para o banquete um cantor harmonioso.
A música é uma excelente parte da
educação e deve ser ensinada às crianças, senão como necessária ou útil para
ganhar a vida, pelo menos como liberal e honesta.
Deve-se também fazer com que as
crianças, aprendam algum talento útil, tal como a arte de ler e escrever, não
apenas pelo proveito que se pode tirar disso, mas também como um mio de chegar
às artes ciências.
OS LIMITES DA GINÁSTICA
Até a puberdade só se praticarão
exercícios leves, sem sujeitar os corpos aos excessos de alimentação, nem aos
trabalhos violentos, por temor de que isso impeça o crescimento.
Depois da puberdade, quando tiverem
passado três anos ocupados com outros estudos, convirá então ocupar a idade
seguinte com os trabalhos e o regime prescrito pela lei do ginásio.
Com efeito, não se deve atormentar
ao mesmo tempo o espírito e o corpo. Desses exercícios, um impede o outro, o do
corpo é nocivo ao espírito e do espírito ao corpo.
CAPÍTULO VII
DAS DIMENSÕES E DA
LOCALIZAÇÃO DA CIDADE
Um fundador de Estado e um
legislador deve saber sobre o elemento que consiste no número e na qualidade
dos habitantes. Quantos deles é preciso e de que espécie? O segundo consiste na
grandeza e na fertilidade da região.
GRANDEZA DESEJÁVEL DO ESTADO
É difícil – a experiência prova até
que é quase impossível que um Estado ou mesmo uma Cidade muito povoada seja bem
governada. Dentre aquelas que consideramos bem policiadas, não vemos nenhuma
cuja população seja excessiva.
Um Estado não é grande porque é
cheio de habitantes, porque escravos, domiciliados e estrangeiros não são
habitantes qualificados como os cidadãos.
Não pensaremos em chamar de “grande”
a Cidade de onde vêm muitos operários e poucos guerreiros. Grande e Povoado são
duas coisas distintas.
A primeira condição para uma Cidade
é ter uma quantidade de habitantes tal que possa bastar para todas as suas
funções e proporcionar todas as comodidades da vida citadina.
Quanto à localização do país,
deve-se seguir a opinião dos militares mais experientes, que pretendem que a
sua entrada seja difícil para os inimigos e a saída fácil para os habitantes;
que, a exemplo da população, a extensão territorial possa ser apreendida com um
olhar, para se poder perceber imediatamente onde é preciso socorro e leva-lo
até lá.
A BOA LOCALIZAÇÃO DA CIDADE
Se estiver em nosso poder escolhê-la
segundo o desejo, a situação da Cidade deve ser próxima do mar e do campo;
assim a ajuda seria fácil de um lugar para outro e de toda parte, assim como a
exportação e importação das mercadorias. Haveria comodidade para transportar a
madeira e todos os outros materiais do país.
Mas, alguns discordam pelo fato de
que essa localização também é perniciosa ao Estado.
Neste caso é evidente que a
proximidade do mar é não apenas mais segura para a cidade e suas dependências,
mas também mais propícia à abundância.
Se não se quer morrer, nem se expor
ao ultraje, deve-se considerar como uma das medidas mais autorizadas pelas leis
da guerra manter suas muralhas no melhor estado de fortificação, principalmente
hoje, quando se imaginaram tantos instrumentos e máquinas engenhosas para
atacar fortificações. Não querer cercar as cidades com muros é como abrir o
país às incursões dos inimigos e retirar os obstáculos de sua frente, ou como
se recusar a fechar com muros as casas particulares, de medo que os que nelas
habitam se tornem medrosos. Deve-se refletir também que os que têm muros ao
redor de suas cidades podem agir como se não os tivessem, opção que falta ao
que não possuem essa proteção.
A DISPOSIÇÃO INTERIOR
O interior das cidades devem ter
muros divididos em corpos de guarda e bastiões, situados em distâncias e
lugares cômodos. Ali devem se instalar
salas de refeições públicas, já que, para estas, é preciso que a multidão dos
cidadãos seja dividida em companhias.
Os templos dos deuses e suas salas
de aparato, onde se realizam os banquetes dos magistrados, devem situar-se em
lugar conveniente, nas mesmas fortificações. As mesas serão colocadas onde se
quiser, contanto que não seja nos santuários ou em lugares reservados pela lei,
como nos santuários ou em lugares reservados pela lei, como o local do tesouro
e dos oráculos.
Uma praça livre para passeios, onde
não haja nenhum comércio e onde não sejam admitidos nem lavradores, nem
artesãos, nem outas pessoas semelhantes, se não forem chamadas pelos
magistrados. Este lugar seria ainda mais
agradável se tivesse um local para exercícios destinado à diversão dos
anciãos, em que a decência distribuiria os lugares de acordo com a idade; os
magistrados presidiriam ali os exercícios dos jovens e os velhos se sentariam
junto aos magistrados.
O mercado deve ficar separado desta
praça, num local cômodo e apropriado para que a ele se conduzam todas as
mercadorias que vierem de todos os lugares, por terra e por água.
Os refeitórios dos sacerdotes devem
ficar perto dos templos. Mas a sala destinada à refeição dos magistrados e seus
subalternos, deverá ficar na parte da cidade mais movimentada e junto ao
comércio de primeiras necessidades.
A mesma ordem será observada no
campo. Haverá pequenos fortes destinados ao mesmo tempo a proteger a região e a
abrigar tanto os oficiais chamados florestais quanto os chamados agrônomos.
Deve também haver templos nas aldeias, consagrados uns aos deuses, outros aos
heróis.
CAPÍTULO VIII
DAS FUNÇÕES E DAS CLASSES
SOCIAIS
As diferentes partes que compõem os
seres não pertencem todas de tal forma à sua essência que seja preciso a sua
reunião absoluta para constituir um corpo organizado. Esta lei se aplica à
Cidade.
OS ELEMENTOS NECESSÁRIOS À
EXISTÊNCIA DA CIDADE
O Estado ou Cidade é uma sociedade
de pessoas semelhantes com vistas a levar junta a melhor vida possível. Sendo,
portanto, a felicidade o maior bem e consistindo no exercício e no uso perfeito
da virtude, e sendo possível que alguns participem muito dela e outros pouco ou
absolutamente nada, esta diversidade teve necessariamente que produzir várias
espécies de Estados e de governos, segundo o gênero de vida e os meios que cada
povo emprega para alcançar o bem-estar.
A cidade precisa:
1º
de víveres;
2º
de artes e ofícios, pois a vida necessita de muitos instrumentos;
3º
de armas;
4º
de numerário para o comércio dos cidadãos entre si e para os negócios da
guerra;
5º
de ministros;
6º
de conselhos e de tribunais que conheçam toda espécie de interesses e de
direitos de cidadão para cidadão.
A ESPECIALIZAÇÃO DAS FUNÇÕES
É impossível separar a felicidade da virtude;
portanto, é claro que num Estado tão perfeitamente constituído que não admita
como cidadãos senão pessoas de bem, não apenas sob certos aspectos, mas
integralmente virtuosos, não devemos contar
entre os cidadãos aqueles que exercem profissões mecânicas ou
comerciais, sendo esse gênero de vida ignóbil e contrário à virtude; nem mesmo
os lavradores, pois é preciso mais lazer do que eles têm para adquirir virtudes
e para o exercício dos cargos civis.
Restam, portanto, os homens de
guerra, os membros do Conselho que deliberam sobre o interesse público e os
juízes que sentenciam sobre o direito dos pleiteantes. São estes, sem dúvida,
os principais membros do Estado.
Pergunta-se se estas funções devem
ser divididas ou se podem ser acumuladas. É também evidente que, uma vez que
certas funções exigem idades diferentes – uma exige prudência, a outra coragem
-, devem empregar-se pessoas diversas.
Nada impede que elas passem em
seguida de uns para outros. É até bom que isto aconteça.
Convém que os cidadãos também tenham
riquezas. Devem gozar de certa prosperidade, pois a cidadania não pode
prostituir-se pelos trabalhadores manuais, nem por outras pessoas a quem a
prática da virtude é desconhecidos.
Restam os sacerdotes. Convém não
ligar ao culto divino senão cidadãos, e não se devem educar para o sacerdócio
nem lavradores que puxam arado, nem trabalhadores que saem de sua forja.
À
classe dos instrumentos necessários pertencem os lavradores, os artesãos e
todos os mercenários, à dos cidadãos, os homens de guerra e de lei, quer
exerçam estas funções de uma vez para sempre, quer as exerçam alternadamente.
CARÁTER TRADICIONAL DAS
CLASSES
Esta
necessidade de dividir o Estado em classes diversas, segundo a variedade das
funções, e de separar os homens de guerra dos lavradores não é uma invenção de
hoje, nem um segredo recém-descoberto pelos filósofos que se ocupam de
política. Tal distinção foi introduzida no Egito pelas leis de Sesóstris e em
Creta pelas de Minos. Elas ainda subsistem atualmente nestes lugares.
Ao que parece, inicialmente a
necessidade inventou as coisas necessárias; em seguida, por adjunção, as que
servem para um maior conforto e para ornamento. O mesmo ocorre com a legislação
e as constituições civis. Podemos conjecturar como elas são antigas pelo
exemplo dos egípcios, que remontam à mais alta antiguidade e desde sempre
tiveram leis e uma constituição. Cabe a nós aproveitar suas boas invenções e
lhes acrescentar o que lhes falta.
A PARTILHA DOS BENS
O uso da riqueza deve ser comunicado
como entre amigos.
Todos concordam que as mesas comuns
e as refeições públicas convêm às cidades bem organizadas politicamente.
Outro tipo de despesa comum a todo o
Estado é a do culto.
As terras serão divididas entre
particulares e as comuns e estas divididas entre o culto e as refeições
públicas.
Quanto aos cultivadores, se for
possível escolher, devem ser todos escravos, mas nem de uma mesma nação ou de
mesma tribo, nem audaciosos demais. Eles serão mais úteis nos trabalhos do
campo e menos inquietantes para o Estado. Na falta de Escravos, tomar-se-ão
trabalhadores do país vizinho, de mesmo caráter que os acima. Os dos proprietários
particulares lhes pertencerão e cultivarão suas terras, os da nação serão
escravos públicos e explorarão a gleba comum.
Já indicamos como se deve usar dos escravos e
por que é melhor dar-lhes a todos, como recompensa, a perspectiva da liberdade.
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