segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

RESENHA - LEVIATÃ de THOMAS HOBBES - CAPÍTULOS XIII, XIV e XV


UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO
FACULDADE DE DIREITO





JORDANIA MARCIA CARVALHO LEAL





THOMAS HOBBES – CAPÍTULOS XIII: “Da Condição Natural da Humanidade Relativamente à Sua Felicidade e Miséria”; CAPÍTULO XIV: “Da Primeira e Segunda Leis Naturais, e Dos Contratos; CAPÍTULO XV: “De Outras Leis De Natureza.






CUIABÁ
2012
1 – INTRODUÇÃO
1.1  – OBJETIVO
O objetivo desta atividade é fazer uma resenha crítica sobre os três capítulos da obra: Leviatã, do autor Thomas Hobbes. Devido à importância de seu trabalho, na contribuição para fundamentar o nascimento do Contrato. Parte de fundamental interesse do Direito Civil e da sociedade para melhor entender as relações humanas e comerciais.
Serão abordados os capítulos XIII, XIV e XV os quais foram escolhidos pela professora Ma. Karine Krewer, que leciona a disciplina de Filosofia Geral do Direito, no curso matutino de Direito na Universidade Federal de Mato Grosso, turma esta da qual faço parte.
Neste caso a sociedade civil organizada cria o Estado para ser o mediador das relações, ou seja, dos pactos entre os interessados. O homem é mau por natureza, por isso, em estado de natureza: a lei é de todos contra todos. Um caos se estabelece e para que haja liberdade o ser humano cria o Estado e com ele a justiça e as leis, serão estabelecidas e cumpridas, caso contrário, entrará o Estado, com as sanções punitivas. Embora o Estado também apresente sanções premiativas.

1.2  – JUSTIFICATIVA
O autor foi escolhido por se tratar de um contratualista, seu contexto histórico está entre os séculos XVI e XVII, Thomas Hobbes nasceu na Inglaterra, berço do capitalismo. Parte do princípio de que o homem é mau por natureza, e é criticado por Rousseau, no século XVIII, que também é contratualista, mas que partirá do contrário, de que o homem é bom por natureza. Ambos escrevem sobre o Contrato Social, embora Rousseau ganhará um prêmio por seus escritos,  não implica na importância da Tese exposta por Hobbes no século XVII.
Percebe-se que o descobrimento da América foi ao século XVI, Hobbes vive essa época de novos povos, viajantes que trazem notícias sobre os índios, designados como selvagens, pessoas exóticas, sociedades primitivas são observadas e analisadas no ponto de vista europeu, e não pelo olhar indígena, ocorre o evolucionismo, etnocentrismo, a antropologia está em alta, e junto com ela os interesses econômicos que unem as nações, que no caso será unido pelo mercantilismo, absolutismo e capitalismo posteriormente, quando bem definido o modo de produção, este tomará conta dessas sociedades regulando e controlando a vida das pessoas. O Estado nasce com essa sociedade civil organizada, para ora libertá-la e ora oprimi-la para o bem do todo, do geral, e segundo Hobbes, com o nosso consenso, pois esse foi o meio que encontramos para resolver os tempos de guerra e trazer a paz, para poder sobreviver.
Pesquisar sobre a obra Leviatã, nos é apresentado uma tripla relevância: social, científica e pessoal. Social porque como podemos observar Thomas Hobbes se mostra um cientista social com sua tese sobre o nascimento da sociedade, com bases jurídicas e políticas, cujos alicerces a mantém durante séculos. Ainda com caráter jurídico funciona como citações para doutrinas jurídicas, filosóficas e sociais. Caráter científico, porque o livro foi escrito com riquezas de detalhes, sistematizado como a ciência que requer autenticidade, clareza e pesquisa profunda do assunto abordado. E, finalmente pessoal, porque nos remete a uma leitura intensa, de entrega, para com os escritos do autor, o que contribuirá para nosso crescimento intelectual individual, dessa maneira nós alunos podemos concordar, sendo fiéis ao autor, discordar se assim for, mas neste caso, a leitura ficará mais densa, porque teremos que nos referenciar a outros autores para tentar criar a máquina de guerra para bombardear as teses, sabendo que mesmo assim, a obra não deixa de ter seu imensurável valor intelectual.

2        – FUNDAMENTOS TEÓRICOS
2.1  – CAPÍTULO XIII: “Da Condição Natural Da Humanidade Relativamente À Sua Felicidade E Miséria”

Este capítulo começa pela definição da igualdade entre os homens, sendo natural a igualdade entre os homens, no que diz respeito ao corpo e ao espírito. Mesmo que os homens sejam diferentes no corpo, exemplos uns mais fortes e outros mais fracos, mesmo assim se um quiser matar o outro consegue, porque se não conseguir fazer sozinho, por ser mais fraco se aliará a um ou alguns para matar o mais forte, ou ainda se não conseguir, maquinará um meio para adquiri-lo, dessa forma o autor esclarece o fato de quê os homens são iguais por natureza. Tanto um como o outro pode matar uns aos outros, então são iguais naturalmente, independentes da sua forma física.
Quanto ao espírito, que é a sabedoria e inteligência, que são individuais de cada um, e que não nascemos com elas, ou seja, estas não são naturais, elas são adquiridas ao longo do tempo, por outras pessoas que nos ensinam, por nossas experiências, por nossas dedicações sobre algum conhecimento científico. Sobre este assunto o autor reflete sobre a questão de que os homens reconhecem que uns sabem mais e outros menos, que uns são mais sábios que outros, entretanto isto prova mais uma vez de quê os homens são iguais por natureza e não diferentes, porque o mais sábio e o menos sábio pensa igualmente sobre o assunto que há distância entre a sabedoria e de outro. Mas que mesmo assim, cada um é contente com a sabedoria que lhe couber, tornando-os igual novamente por natureza. A ciência que é o raciocínio coerente, inteligente, é uma lógica para poucos. A prudência é fruto da experiência. Assim Thomas Hobbes diz:
 “A NATUREZA fez os homens tão iguais quanto às faculdades do corpo e do espírito que, embora por vezes se encontre um homem manifestamente mais forte de corpo, ou de espírito mais vivo do que outro, mesmo assim, quando se considera tudo isto em conjunto, a diferença entre um e outro homem não é suficientemente considerável para que qualquer um possa com base nela reclamar qualquer benefício a que outro não possa também aspirar, tal como ele. Porque quanto à força corporal o mais fraco tem força suficiente para matar o mais forte, quer por secreta maquinação, quer aliando-se com outros que se encontrem ameaçados pelo mesmo perigo.”
Quanto às faculdades do espírito (pondo de lado as artes que dependem das palavras, e especialmente aquela capacidade para proceder de acordo com regras gerais e infalíveis a que se chama ciência; a qual muito poucos têm, e apenas numas poucas coisas, pois não é uma faculdade nativa, nascida conosco, e não pode ser conseguida – como a prudência – ao mesmo tempo que se está procurando alguma outra coisa), encontro entre os homens uma igualdade ainda maior do que a igualdade de força. [...]. Pois a natureza dos homens é tal que, embora sejam capazes de reconhecer em muitos outros maior inteligência, maior eloquência ou maior saber, dificilmente acreditam que haja muitos tão sábios como eles próprios; porque veem sua própria sabedoria bem de perto, e a dos outros homens à distância. Mas isto prova que os homens são iguais quanto a esse ponto, e não que sejam desiguais. Pois geralmente não há sinal mais claro de uma distribuição equitativa de alguma coisa do que o fato de todos estarem contentes com a parte que lhes coube. (HOBBES, LEVIATÃ, 2000, p.107 e 108).
Se dois homens desejarem a mesma coisa, se tornarão inimigos, para conseguir seus fins, os homens irão por antecipação fazer de tudo para destruir o outro e conseguir para si o que desejou, portanto, aqui estão questões que são abordadas desde antes do nascimento de Cristo, na República de Platão, Sócrates fala sobre nossas paixões, nossos desejos, nossos luxos que fazem com que o homem perca os valores de controle social, para satisfazer suas vontades, acima de qualquer coisa, no livro I, quando Sócrates elogia a velhice, Céfalo falará no diálogo com Sócrates, da felicidade de Sófocles de ter se livrado dessas paixões, e do encontro com um caráter equilibrado de boa índole, tornando a velhice melhor.
No caso de Thomas Hobbes, o homem não abre mão de suas paixões de seus desejos, por isso pelo motivo de conservação de sua espécie ou para seu deleite, ele fará de tudo para conquistar o que convém. Utilizará, portanto sua força, mas sabe que outro homem poderá por cobiça depois de semear, plantar e construir, por exemplo, numa terra outro homem pode pela mesma força despossui-lo de seu território, então trará a questão de que no mundo contemporâneo somos consumistas e acumulamos riquezas, assim outros desprovidos dessa riqueza cobiçam nossas mercadorias, é por isso que temos a polícia que representa o Estado mediador do pacto, do contrato social, do que é meu e do que é seu, e esta se utiliza da força física e do poder simbólico, o poder da palavra. Dessa maneira percebe-se que desconfiamos do outro, e por isso por antecipação, utilizamos a força e o poder, para nos sentirmos seguros. Os homens para Hobbes, não sentem prazer na companhia de outros homens, na verdade o que acontece é que suportamos os outros, estar junto cria um enorme desprazer. Portanto viver em sociedade é suportar o outro, assim a natureza do homem encontra-se três causas principais de a discórdia: a competição, a desconfiança e a glória. A competição faz com que os homens ataquem uns aos outros para obter lucros que serão as vantagens, se sentirem seguros mantendo o poder e a reputação que é a vaidade.
Portanto, se os homens não tem um poder único supremo que durante esse tempo os ordenem que no caso, é o nascimento do Estado como soberano (poder absoluto), os homens por serem maus por natureza, estão num estado de natureza, direito natural, em estado de guerra, e assim, na luta de todos contra todos em que o homem é inimigo do próprio homem.
E contra esta desconfiança de uns em relação aos outros, nehuma maneira de se garantir é tão razoável como a antecipação; isto é, pela força ou pela astúcia, subjugar as pessoas de todos os homens que puder, durante o tempo necessário para chegar ao momento em que não veja qualquer outro poder suficientemente grande para ameaçá-lo. [...] Por outro lado, os homens não tiram prazer algum da companhia uns dos outros (e sim, pelo contrário, um enorme desprazer), quando não existe um poder capaz de manter a todos em respeito. Porque cada um pretende que seu companheiro lhe atribua o mesmo valor que ele se atribui a si própria e, na presença de todos os sinais de desprezo ou de subestimação... De modo que na natureza do homem encontramos três causas principais de discórdia. Primeiro, a competição; segundo, a desconfiança; e terceiro a glória.
A primeira leva os homens a atacar os outros tendo em vista o lucro; a segunda, a segurança; e a terceira, a reputação.
Com isso se mostra manifesto que, durante o tempo em que os homens vivem sem um poder comum capaz de os manter a todos em respeito, eles se encontram naquela condição a que se chama guerra; e uma guerra que é de todos os homens contra todos os homens. (HOBBES, LEVIATÃ, 2000; p. 108 e 109).
Hobbes fará uma comparação entre o clima e o tempo no qual o homem guerreia, dizendo que não é uma guerra real, e sim, disposição para lutar, e pode ser durante muito tempo, como acontece na natureza quando a chuva é intensa, raios, trovões, tempestades que assolam as regiões, eram comuns nessa época falar sobre o clima, pois até mesmo o temperamento das pessoas era analisado geograficamente, devido ao clima, estudos da antropologia sobre o descobrimento da América apresentam autores se referindo à cultura de povos conforme a região que habitava.
Define então o estado de natureza, que é o tempo de guerra, lugar onde não conseguiremos produzir, temos medo, não temos segurança, o temor da morte violenta nos oprime e a vida do homem é solitária, embrutecida e curta. Neste estado, não há liberdade, não há sociedade, e consequentemente, ainda não existe a figura do Estado.
Thomas Hobbes dará uma resposta a Rousseau, que é um contratualista que parte do princípio de que o homem é bom por natureza. Partindo de fatos reais, dos quais costumamos fazer, quando viajamos, levamos conosco armas e vamos acompanhados de outros homens, pois, se ocorrer algo estranho a nós, iremos lutar e guerrear, para sobrepor ao outro; quando dormimos fechamos as portas, porque temos medo de outro homem, que possa nos agredir enquanto estamos indefesos, pegar nossas coisas; trancamos nossos cofres, mesmo estando em casa, muitas vezes não confiamos nem no homem próximo de nós, como amigos e familiares, mesmo sabendo que existem soldados armados para nos vingar, agimos dessa maneira, logo, não somos bons, somos mau por natureza.
Para que nossas ações sejam ilícitas, é necessária a criação de leis, que proíbem essas ações, mas antes de tudo é necessário saber e confirmar quem irá criar as leis, portanto, novamente se pensa no Estado como o poder soberano para determinar o que pode, ou não ser aceito na sociedade, no nosso caso, o legislativo criam as leis, através de comissões, debates, discussões com a sociedade, audiências públicas, embora no Brasil a maioria do povo não tenha consciência política, mas há representações como sindicatos, grupos políticos estruturados, ruralistas, empresários, estes influenciam os senadores e deputados na votação da lei, são chamados por Tercio Sampaio Ferraz Junior de núcleos significativos, com valores e ideologias que determinam e negociam as leis com nossos representantes. Há também hoje no Brasil, o STF – Supremo Tribunal Federal, que vem passando por cima do legislativo, ganhando cada vez mais poder e modificando a legislação, normatizaram a união estável homoafetiva, o aborto para bebês anencefálicos, entre outros. No estado de natureza não justiça e não há lei, não há propriedade e nem domínio, não há sociedade civil organiza. A força e a fraude são as virtudes humanas, no estado de guerra.
Assim, o homem percebe que necessita da paz, pois tem medo da morte violenta, e é por isso, que aceitará se submeter ao estado civil, ao Estado, a sociedade civil organizada, e através do trabalho conquistará sua propriedade, agora com segurança mediado pelo poder estatal. Max Weber diria que o homem, então legitima num sentido de consenso o poder do Estado como mediador das ações humanas. Karl Marx, falará sobre a extinção do Direito, se caso houvesse ocorrido à extinção do Estado, visto que estes dois nascem juntos, e se um acabar o outro também se findaria, dessa maneira expôs que se do modo de produção capitalista, passássemos para o socialismo e depois para o comunismo, então não haveria Estado, e consequentemente o Direito seria extinto.
(...). Os desejos e outras paixões do homem não são em si mesmos um pecado. Nem tampouco o são as ações que derivam dessas paixões, até o momento em que se tome conhecimento de uma lei que as proíba; o que será impossível até o momento em que sejam feitas as leis; e nenhuma lei pode ser feita antes de se ter determinado qual a pessoa que deverá fazê-la. [...] Desta guerra de todos os homens contra todos os homens também isto é consequência: que nada pode ser injusto. As noções de bem de mal, de justiça e injustiça não podem aí ter lugar. Onde não há poder comum não há lei, e onde não há lei não há injustiça. Na guerra, a força e a fraude são as duas virtudes cardeais. (...) Outra consequência da mesma condição é que não há propriedade, nem domínio, nem distinção entre o meu e o teu; só pertence a cada homem aquilo que ele é capaz de conseguir, e apenas enquanto for capaz de conservá-lo. É, pois esta a miserável condição em que o homem realmente se encontra, por obra da simples natureza. (...) As paixões que fazem  os homens tender para a paz são o medo da morte, o desejo daquelas coisas que são necessárias para uma vida confortável, e a esperança de consegui-las através do trabalho. E a razão sugere adequadas normas de paz, em torno das quais os homens podem chegar a acordo. (HOBBES, LEVIATÃ, 2000, p.110 e 111).


2.2  - CAPÍTULO XIV: Da Primeira E Segunda Leis Naturais, E Dos Contratos
Começará o capítulo definindo Direito natural, o Jusnaturalismo, que Hobbes definirá como o homem que tem a liberdade de usar o seu próprio poder, da maneira que quiser, sem pudores, conforme seu julgamento e razão, o homem é soberano e pode fazer o que quiser. A essa liberdade ele dirá que não existe nenhum impedimento externo que limite este homem.
 A primeira lei natural é procurar a paz e seguir a paz, é também nos defendermos por todos os meios que pudermos. A segunda lei natural é que definirá o Contrato Social, o pacto, o contrato nasce da renúncia do direito natural, para sairmos do estado de guerra, renunciamos nosso direito natural de defesa e assumimos um pacto com o outro homem, que nos levará a paz, neste momento, nasce a sociedade civil e difere o meu do seu, nasce a propriedade. O contrato apresenta-se de maneira a transferir algum benefício à outra pessoa, ou outras pessoas, o que lhe cabe, agora com justiça, lei definida e mediadores, os juízes, representantes do Estado. O homem dará sua palavra ou através de ações, se comprometerá, com a outra parte, a partir do momento em que fixa essa obrigação, deverá ser respeitada e cumprida, caso contrário, recorrerá à parte desfavorecida no poder de polícia, ou no poder de justiça, para que se cumpra o contrato. Não podemos renunciar nossa própria vida, assim nasce à defesa pessoal, no qual temos o direito de em legítima defesa, para nos protegermos, até matar outro caso nos ataque, sem motivo algum, o que ocorre, por exemplo, quando estamos em nossa residência e adentra um ladrão, ou qualquer pessoa e nos ataque, se o ferirmos ou se chegar a morte, não ficará preso, porque matamos por legítima defesa. Entretanto, como não queremos que isso ocorra mesmo em liberdade, ocorrem casos em que a pessoa se martiriza, devido a questões psicológicas, valores morais, éticos, área da psicologia e psiquiatria, para ajudar na compreensão e conformação do fato, para retirada de qualquer problema psicológico, caso que o Direito não tem como resolver, porque é pessoal e individual, da subjetividade de cada pessoa. Na doação não há contrato, porque acontece unilateralmente, para que seja contrato ambas as partes entram em jogo, o qual Hobbes chamará de pacto ou convenção, e acontecerá principalmente no comércio para mediar as relações comerciais, na troca de bens e serviços.
O Direito de natureza, a que os autores geralmente, chamam jus naturale, é a liberdade que cada homem possui de usar seu próprio poder da maneira que quiser, para preservação de sua própria natureza, ou seja, de sua vida; e consequentemente de fazer tudo aquilo que seu próprio julgamento e razão lhe indiquem como meios adequados a esse fim.
Por liberdade entende-se, conforme a significação própria da palavra, a ausência de impedimentos externos, impedimentos que muitas vezes tiram parte do poder que cada um tem de fazer o que quer, mas não pode obstar a que use o poder que lhe resta, conforme o que seu julgamento e razão lhe ditarem.
(...) Porque embora os que têm tratado deste assunto costumem confundir jus e Lex, o direito e a lei, é necessário distingui-los um do outro. Pois o direito consiste na liberdade de fazer ou de omitir, ao passo que a lei determina ou obriga a uma dessas duas coisas. De modo que a lei e o direito se distinguem tanto como a obrigação e a liberdade, as quais são incompatíveis quando se referem à mesma matéria.
[...] A primeira parte desta regra encerra a lei primeira e fundamental de natureza, isto é, procurar a paz, e segui-la. A segunda encerra a suma do direito de natureza, isto é, por todos os meios que pudermos defendermo-nos a nós mesmos.
Desta lei fundamental de natureza, mediante a qual se ordena a todos os homens que procurem a paz, deriva esta segunda lei: Que um homem concorde, quando outros também o façam, e na medida em que tal considere necessário para a paz e para a defesa de si mesmo, em renunciar a seu direito a todas as coisas, contentando-se, em relação aos outros homens, com a mesma liberdade que os outros homens permitem em relação a si mesmo. Porque enquanto cada homem detiver seu direito de fazer tudo quanto queira todos os homens se encontrarão numa condição de guerra.
[...] A transferência mútua de direitos é aquilo a que se chama contrato. (...) Neste caso, da sua parte o contrato se chama pacto ou convenção. Ambas as partes podem também contratar agora para cumprir mais tarde, e nesse caso, dado que se confia naquele que deverá cumprir sua parte, sua ação se chama observância da promessa, ou fé; e a falta de cumprimento (se for voluntária) chama-se violação da fé. (HOBBES, LEVIATÃ, 2000, p.113-116).

O poder coercitivo é necessário, porque se uma das partes não cumprir com o pacto, terá que ser recorrido a justiça e ao poder de polícia, ou seja, ao Estado exigir que se cumpra o que foi prometido e assinado. A promessa de algo impossível não é pacto, ou seja, não entra no contrato. Um homem pode ficar liberado de um contrato se cumpri-lo ou ser liberado de cumprir.

2.3  – CAPÍTULO XV: De Outras Leis de Natureza
Neste capítulo, Thomas Hobbes irá expor várias leis, começa com a lei pela qual os homens devem cumprir o contrato firmado entre as partes. Porque se não for assim então os pactos seriam vãos, palavras vazias e retornaríamos a condição de guerra. E é nesta lei que está à origem da justiça, pois no estado de guerra não existia nem justo e muito menos injusto, com a lei, com o pacto rompe-se com o injusto e cria-se a justiça, que nada mais é que obedecer a lei.   
(...) Que os homens cumpram os pactos que celebrarem. Sem esta lei os pactos seriam vãos, e não passariam de palavras vazias; como o direito de todos os homens a todas as coisas continuaria em vigor, permaneceríamos na condição de guerra.
Nesta lei de natureza reside a fonte e origem da justiça. (...) Mas, depois de celebrado um pacto, rompê-lo é injusto. E a definição da injustiça não é outra senão o não cumprimento de um pacto. E tudo o que não é injusto é justo. (HOBBES, LEVIATÃ, 2000, p. 123).

O poder de polícia e a punição são novamente citados, para que se tenha certeza de que o contrato será cumprido, este poder quem estabelecerá é o Estado, o nascimento da sociedade civil marca nossa ideia sobre a propriedade, esses três elementos constituídos: Estado, Propriedade e Sociedade civil organizada irão propagar a paz, exigindo o cumprimento das leis e acabando com o estado de natureza.
(...) é necessária alguma espécie de poder coercitivo, capaz de obrigar igualmente os homens ao cumprimento de seus pactos, mediante o terror de algum castigo que seja superior ao benefício que esperam tirar do rompimento do pacto, e capaz de fortalecer aquela propriedade que os homens adquirem por contrato mútuo, como recompensa do direito universal a que renunciaram. E não pode haver tal poder antes de erigir-se um Estado. O mesmo pode deduzir-se também da definição comum de justiça nas Escolas, pois nelas se diz que a justiça é a vontade constante de dar a cada um o que é seu. Portanto, onde não há o seu, isto é, não há propriedade, não pode haver injustiça. E onde não foi estabelecido um poder coercitivo, isto é, onde não há Estado, não há propriedade, pois todos os homens têm direito a todas as coisas. (HOBBES, LEVIATÃ, 2000, p.123 e 124).

Thomas Hobbes definirá justiça como o cumprimento dos pactos e é fato que está recheada de razão, nos proíbe de destruir nossa vida, e consequentemente, é uma lei da natureza, este é um autor naturalista, por isso todas suas teses estão fundamentadas na natureza, nascemos com elas, é natural no homem ser assim.
(...) Portanto, a justiça, isto é, o cumprimento dos pactos, é uma regra da razão, pela qual somos proibidos de fazer todas as coisas que destroem a nossa vida, e, por conseguinte é uma lei da natureza. (HOBBES, LEVIATÃ, 2000, p. 125).

O homem honrado é aquele que se preocupa com suas ações, tem o cuidado de agir justamente, já o homem iníquo não tem esses cuidados e comete injustiças. A justiça é uma virtude e a injustiça, é vício. A injúria é quando caluniamos uma pessoa ou difamamos.  Ocorre também de uma pessoa ser chamada de injusta, se, por exemplo, ser representado por outra pessoa e esta não cumprir com o pacto, assim se caso acontece, o dano recairá sobre o qual não havia obrigação, ou seja, a pessoa que não faz parte do contrato, e que foi apenas receber de quem tinha entregar e não o fez, sendo esta pessoa injuriada ou difamada, ela pode recorrer por ter sofrido esta injustiça, pois foi denigrida sua honra.
Definirá justiça comutativa e justiça distributiva, na comutativa é dar o que é de cada um o que é seu, lembrando que trata-se de homens iguais; a distributiva é dar a cada um o que cada um merece, por se tratar de homens em condições diferentes, está ligado a equidade (que será uma outra lei). Tercio Sampaio Ferraz Junior falará sobre direito e justiça, o direito está separado da justiça, o direito não consegue medir suas ações como um direito totalmente justo, a justiça está fora do direito, e portanto distante consegue olhar para o direito e dizer se está ou não sendo justo, em sua obra  define justiça comutativa em dividir as coisas entre pessoas iguais; e justiça distributiva dividir as coisas entre pessoas diferentes. É a justiça formal que se divide em código forte (justiça comutativa), a igualdade; e código fraco, a justiça material (justiça distributiva), a equidade.
[...] Para falar com propriedade, a justiça comutativa é a justiça de um contratante, ou seja, o cumprimento dos pactos, na compra e na venda, no aluguel ou sua aceitação, ao emprestar ou tomar emprestado, na troca, na permuta e outros atos de contrato.
A justiça distributiva é a justiça de um árbitro, isto é, o ato de definir o que é justo. Pelo qual (merecendo a confiança dos que o escolheram como árbitro), se ele corresponder a essa confiança, se diz que distribui a cada um o que lhe era devido. Com efeito, esta é uma distribuição justa, e pode ser chamada (embora impropriamente) justiça distributiva. Mais próprio seria chamar-lhe equidade, a qual é também uma lei de natureza, conforme se mostrará no lugar oportuno. (HOBBES, LEVIATÃ, 2000, p. 127).

A gratidão é a quarta lei, o desrespeito a essa lei é a ingratidão. A quinta lei é a complacência, que é a benevolência, a tolerância com o outro, é ser sociável, contrário a esta lei será insociável, intratável. A sexta lei da natureza é o perdão a quem se arrependeu do que fez para garantia da paz. A sétima lei é a vingança, mas não é para retribuir o mal com o mal e sim um bem futuro, caso contrário, será crueldade.
[...] Tal como a justiça depende de um pacto antecedente, assim também a gratidão depende de uma graça antecedente, quer dizer, de uma dádiva antecedente. É esta a quarta lei de natureza, que pode ser assim formulada: Que quem recebeu benefício de outro homem, por simples graça, se esforce para que o doador não venha a ter motivo razoável para arrepender-se de sua boa vontade. (...) O desrespeito a esta lei chama-se ingratidão, e tem com a graça  a mesma relação que há entre a injustiça e a obrigação por contrato.
A quinta lei de natureza é a complacência, quer dizer: Que cada um se esforce por acomodar-se com os outros. (...) Aos que respeitam  esta lei pode chamar-se sociáveis (os latinos chamavam-lhes commodi), e aos que não o fazem obstinados, insociáveis, refratários ou intratáveis.
A sexta lei de natureza é Que como garantia do tempo futuro se perdoem as ofensas passadas, àqueles que se arrependeram e o desejem. Porque o perdão não é mais do que uma garantia de paz, a qual, embora quando dada aos que perseveram em sua hostilidade não seja paz, mas medo, quando recusada aos que oferecem garantia do tempo futuro é sinal de aversão pela paz, o que é contrário à lei de natureza.
A sétima lei é Que na vingança (isto é, a retribuição do mal com o mal) os homens não olhem à importância do mal passado, mas só à importância do bem futuro. (HOBBES, LEVIATÃ, 2000, p.127 e 128).

A oitava lei da natureza será o desprezo e seu desrespeito contumélia.
      Thomas Hobbes fará crítica ao pensamento aristotélico, onde Aristóteles na obra A Política, diferencia a cidade composta pelo senhor e escravo, utilizando a inteligência e o corpo físico, para explicar sobre os homens que nasceram para mandar e os que nascem para obedecer. Para Hobbes essa ideia é contra a razão e contra a experiência. No capítulo XIII, ele responde sobre o fato de que os homens são iguais por natureza e que apesar de saber que através da educação uns sabem mais que os outros, ainda assim sabem que são iguais, porque reconhecem essa diferença e estão satisfeitos com a parte que lhe couber, mas que no estado natural, ou seja, de guerra, não há diferença, neste caso agirão igualmente. Para Hobbes todos os homens preferem governar a serem governados.
Na nona lei é sabido que todos os homens são iguais por natureza, o que não acredita ser assim estará desrespeitando a nona lei, e, por conseguinte, é orgulhoso.
A décima lei dirá que como somos iguais, o que é reservado para si também o será para o outro, assim quem a respeita é modesto, e desrespeitá-la é ser arrogante.
A décima primeira lei tem a ver com a equidade, que geralmente apresentará um árbitro (juiz – autoridade estatal), que terá o trabalho de fazer justiça, na entrega da justiça distributiva. Sua violação será acepção de pessoas, prosopolepsía.
A décima segunda lei se refere às coisas que não podem ser divididas como a água, por exemplo, terá que ser um bem distribuído em comum para toda sociedade. E será justiça distributiva e terá que ter um árbitro quando não tem como dividir os bens em comum, para toda sociedade, então poderá ser por sorteio, para que haja equidade na distribuição. Há duas espécies de sorteio: arbitrário e natural.
A décima terceira lei é sobre os mediadores, diplomatas, os representantes do Estado, seu salvo-conduto.
A décima quarta lei é se o caso exigir for submetido ao julgamento de um árbitro. Neste caso o árbitro terá autoridade de decidibilidade.
Estas são as leis da natureza, todos devem obedecê-las, para que a sociedade tenha paz, elas são leis verdadeiras, justas, é a ciência da filosofia moral, porque esta ciência, segundo o autor não é mais do que a ciência do que é bom e mau na conservação  e na sociedade humana.
3 – CONCLUSÕES

      Através desta leitura concluímos que o autor Thomas Hobbes, parte do princípio de que o homem é mau por natureza, e por isso, vivemos em constante estado de natureza, ou seja, num estado de guerra, de todos os homens contra todos os homens. Sofrendo com essas relações o temor, o pavor, o pânico, com o passar dos tempos resolvemos em nome da paz, criar o Estado, a sociedade civil organizada, trará a ideia, o pensamento de propriedade, daquilo que é meu e daquilo que é seu, tanto é, que no mundo contemporâneo, esta ideia é tão fixa na mente de todos, que se, por exemplo, alguém esquecer um caderno, ou um livro numa classe ou no escritório, iremos nos perguntar de quem é se tiver com nome saberemos de quem seja, assim havendo mais de uma pessoa, mesmo que um querer tomar para si, terá o olhar como diz Michael Foucault, em vigiar e punir, o olhar fixo, direto, moralista, de que podem estar furtando o que não é de sua propriedade, todos agem assim, dessa maneira percebe-se um clássico, por fala sobre atitudes reais humanas, que atravessou séculos, e, portanto é atemporal. Revelam-nos nossos instintos, nosso etnocentrismo, nossas paixões, nossos desejos e principalmente a veracidade com que lutamos para conseguir o que queremos, passando por cima de tudo, é muito real e verdadeiro, bem mais que moralista, claro e conciso. A tolerância é algo inevitável para viver em sociedade, acredito que não aceitamos as diferenças, e por isso, essa palavra chave de Hobbes é sinônimo de cientista social, no qual fica claro que suportamos a diferença e não aceitamos que são conceitos diferentes. É bem interessante como criamos um mediador, que é o Estado, que não é ser humano, mas que é representado pelo ser humano, e, por conseguinte carregado de valores, credo, moral e ética. A posição do juiz, do legislativo, o poder da palavra, o relato das leis com suas mensagens, e o mais importante o cometimento, que é a relação metacomplementar entre a autoridade e o sujeito, pensamos ao mesmo tempo em que criamos a lei, estamos submetidos a ela, por isso, não devemos ser cruel, pois o objetivo é o bem futuro e não o mal absoluto, o perdão a quem nos faz o mal, a religiosidade, a moderação na vingança, é tão humano, é relação, é social, do mal para o bem estar de todos, para a coesão social. O ostracismo é o desprezo, banir alguém de sua sociedade, muito grave e perverso, tem que pensar bem antes de tomar essa decisão.
Ao juiz a decidibilidade, nas mãos de uma pessoa, a vida inteira do outro, como aprender a ser justo e correto. O direito nem sempre é justo, às vezes, é ilegítimo, ilícito e injusto. O Direito é uma técnica, segundo Tercio Ferraz Junior, a justiça está fora do Direito e deve medir, discutir e debater sobre esse direito, então aqui entra a Sociologia, a Filosofia, a Antropologia, a Estatística para servir de mediadora para as decisões jurídicas, para que não haja uma guerra civil e voltemos novamente ao estado de natureza de Hobbes.

4– REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
HOBBES, Thomas. Leviatã. Thomas Hobbes. Impressão e acabamento: Gráfica Círculo. Editora Nova Cultural Ltda. 2000. São Paulo-SP



6 comentários:

  1. Simplesmente maravilhoso! adorei tamanha clareza! muito bom!!!

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  2. Muito bom mesmo. Me ajudou imenso.

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  3. Me ajudou bastante. Muito bom essa resenha..

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  4. Hobbes sempre presente e atual, com a devidas proporções, claro !

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  5. O Estado como o monstro Leviatã torna-se necessário em uma sociedade sem lei. Compreender o contexto histórico da construção da obra é primordial. Parabéns pela resenha.
    Atnonio J J Júnior, Historiador

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